domingo, novembro 03, 2013

Convite Lançamento Chuva Secreta


Chuva Secreta: paixão e autenticidade num mundo molhado de signos

O impossível de ser retido, o que não podia sofrer um rewind e renascer. As melhores lembranças. Borboletas dentro de uma chuva secreta, porque impossível, desviando dos pingos, procurando abrigo. Mas ele teimava e conseguia vê-las, uma película de luz sépia, as lembranças quase flutuando: seu pai enchendo o cachimbo, a mãe descascando maçãs pra rechear uma torta, o irmão mais velho ensinando tabuada ao caçula, o tempo esfriando. (Trecho do conto O Gato Que Ri).

Ambientado em cenários diversos e repleto de simbologias, Chuva Secreta, novo livro de contos da escritora Állex Leilla, traz 09 histórias ligadas pelo signo da chuva: forte, fina, rente, inclinada. Com ares de dilúvio. Fechando ou abrindo estações. Prevista ou inesperada, a chuva cai e provoca confissões e reflexões. Partilhas e autoconhecimento. Medo e paixão. Isolamento e entrega. Crimes e descobertas. A água, símbolo da subjetividade humana, varre os tantos mundos “secretos” das personagens, cujas urgências implicam, quase sempre, transformação em suas condições de sujeitos.

Segundo Luiz Bras, nos contos de Chuva Secreta, “a paixão e o medo são vascularizados, cheios de veias e artérias que os conectam ora ao silêncio ora ao estrondo”. E o que provoca o “frenesi” nas histórias, o que motiva “essa batida cardíaca é a busca do sentido de autenticidade”. Para o crítico e escritor, “todos os visionários e visionárias de Állex Leilla procuram desesperadamente a autenticidade. Na pintura, na poesia. No teatro. No outro. Na chuva”.

Seja tentando escapar à perda de foco provocada pelo peso de um drama familiar, seja revisitando o mito da alma gêmea e se deparando com um crime passional, os mundos molhados de Chuva Secreta podem se descortinar em São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Palmas, Maceió, Aracaju, Salvador, ou mesmo frente a uma janela chuvosa. Os cenários são muitos e a sede dos sujeitos, voraz. Por isso, ora podemos flagrar uma jovem leitora cujo desejo recai sobre a vizinha do apartamento da frente, ora nos deixaremos levar pelo tom poético que embala a saudade de um rapaz, cujo companheiro se mandou para o Oriente. Numa janela seguinte, é possível admirar o tom erótico de um sujeito que não se sente nem menino nem menina, mas epiceno, ou nos divertir com o conflito de ares apocalípticos que se desenrola entre um pelotão de varredores de rua e os demais indivíduos que por ali perambulam. Janelas avante! E experimentaremos uma enorme compaixão pelo sujeito que se autodenomina o ser humano mais feio do planeta. A feiura é uma desgraça sem conserto, ele nos avisa logo na primeira linha do conto. Avancemos, a fim de nos perder na complexa história da dramaturga que revisita o baú de inéditos e dispersos da grande amiga já falecida, pondo em xeque toda uma ética acerca do valor dos espólios deixados pelos escritores.

Em verdade, desimporta qual janela ou em qual ritmo iremos, inicialmente, nos perder. O que realmente importa é perceber que em todas as histórias dos visionários e visionárias de Állex Leilla sobram dias chuvosos. E esses têm cheiro, cor, formas, texturas variadas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Em Não se vai sozinho ao paraíso, primeiro romance que integra a trilogia místico-erótica de Állex Leilla — cujo centro são as micro-...