domingo, julho 27, 2008


Falava de uma água limpa,
que correria lenta pelo solo e acordaria a manhã.
De uma água feito cachoeira
mas mansa,
num deslizar quase estudado pelas pedras,
terra,
pés de gente,
patas de bichos.
Como uma canção antiga vai ficando na cabeça desde a infância,
ressonando.
Quando nem compreendemos ainda
a relação inapreensível entre as palavras e os sons.
Fica e some vez-em-quando,
fica e retorna e dói e alegra e novamente some.
Memória de zigue-zague.
Construção meramente gideana: o pântano das lembranças.
Outra: miséria de vida.
Diria, dizíamos, dir-se-ia: pouco importa esclarecer.
É vago e lento o que desejamos: existir dentro de uma língua.
Enternecer-se.
Por isso, voltar.
Voltar ao início, por certo.
Voltemos.
Falava daquela água que a tudo limpa, que acolhe,
que abandona ribanceiras à frente, que purifica.
Aquela água.
Aquela.
(In: São Franciscana)

2 comentários:

  1. Anônimo9:28 PM

    Conteúdo e forma maravilhosa! Esse poema me confortou e deu confiança. Raras emoções para um poema. Esse poema: ponto tranqüilo para a minha inquietude. Beijos.
    Ass: Hubert Fichte.

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  2. Anônimo10:47 AM

    Afinar o ouvido para falar uma palavra exige muito uns mil anos de escuta dessa linguágua.

    assionara
    [n]

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